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O consumo de ácidos gordos ómegas 3 e 6 beneficiam a todos na mesma proporção?

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Nos últimos anos, os ácidos gordos polinsaturados ómega 3 (AGPI n-3) e 6 (AGPI n-6) têm despertado um grande interesse da comunidade científica. São considerados essenciais porque o organismo não consegue sintetizá-los, sendo preciso obtê-los a partir da alimentação (principalmente por peixes gordos, sementes e oleaginosas). Eles estão implicados na maturação e crescimento cerebral e retiniano do recém-nascido, modulam processos inflamatórios, coagulação e metabolismo lipídico.


Estudos populacionais e epidemiológicos têm demonstrado que a ingestão dietética excessiva de AGPI ómega 6, característico das dietas ocidentais, incluindo alimentos processados e óleos vegetais, pode aumentar o risco de desenvolvimento doenças inflamatórias crónicas, como a obesidade e DCV. O rácio AGPI n-6/n-3 tem sido utilizado como um indicador de inflamação, assumindo-se até o presente momento que o ideal deveria estar entre 3:1/ 5:1.


Recomendações de organizações como a American Heart Association (AHT) preconizam, por exemplo, que a população global deva consumir cerca de 5% a 10% de energia proveniente de AGPI ômega-6, buscando-se reduzir o risco de DCV [2]. Ambas as concentrações sanguíneos e teciduais de AGPI são influenciados não apenas através de dieta, mas, em grande parte, também pelos padrões de expressão genética, afetando as taxas de metabolismo dos AGPIs. Ou seja, variantes genéticas podem estar associadas com concentrações mais elevadas de ácido araquidônico (AA), considerado deletério por suas ações pró-inflamatórias. Será então que o metabolismo e necessidades nutricionais dos AGPI ómega-6, por exemplo, é o mesmo em todos os indivíduos/populações?


Buscando responder essa questão Sergeant et al. (2012) estudaram pacientes com diabetes / síndrome metabólica, de ascendência americana ou afro-europeia. Os pesquisadores analisaram se as concentrações de AGPI n-6 e AA poderiam variar de acordo com polimorfismos genéticos localizados no cluster que codifica para as enzimas FADS. Os genes FADS1 e FADS2 codificam as enzimas delta-5 (D5D) e delta-6 dessaturases (D6D) as quais são as enzimas de limitação da taxa de conversão de AGPI ómega 3 em ácido eicosapentaenóico (20:5n-3, EPA) e ácido docosahexaenoico (22:6n-3, DHA) e AGPI ómega 6 em ácido araquidônico (20:4n-6, AA), respectivamente. Os resultados foram intrigantes pois demonstram que há um aumento acentuado da frequência de alelos (rs174537) que favorecem a síntese de AA em afro-americanos com diabetes / síndrome metabólica, corroborando a inicial hipótese de que o metabolismo de AGPI n-6 não é uniforme em todas as populações. Ou seja, as variantes genéticas e suas frequências diferem geograficamente entre as populações estudadas. Os autores sugerem que dependendo do genótipo, o estímulo ao consumo de AGPI n-6 na dieta, como preconizado pela AHT, pode estar a aumentar o risco de desenvolvimento de doenças cardiovasculares na população afrodescendente, e não representar um factor de protecção [3].


Existem mais evidências que associam uma determinada variante no gene FADS1 e a variação das concentrações sanguíneas dos AGPIs. Um estudo avaliou se a variação genética no cluster de genes FADS regula a atividade das enzimas dessaturases em duas populações de jovens adultos canadenses (caucasianos e asiáticos) e se esta alteração teria reflexo em ambos os perfis de AGPI n-3 e n-6. A associação mais significativa detectada foi entre o polimorfismo rs174547 FADS1 e a relação AA: w-6 em ambos caucasianos e asiáticos. Embora a frequencia dos alelos para este SNP tenha diferido sendo menos frequente o T entre os caucasianos, e o C entre os asiáticos, os carreadores do alelo C tinham uma atividade de dessaturase inferior aos carreadores do alelo T em ambos os grupos. Por tanto, os genótipos CC e CT para esta variante estão associados a menores concentrações sanguíneas de ácido araquidônico. Por outro lado, somente em asiáticos o rs498793 em FADS2 teve associação com a relação EPA:n-3. Este estudo mostra que variações genéticas no cluster das FADS (em particular o rs174547) podem alterar a atividade das dessaturases em indivíduos de etnia branca e descendência asiática [4]. Portanto, os polimorfismos nos genes FADS determinam a eficiência com que os AGPI são processados endogenamente.


Estudos como estes reforçam a necessidade de uma intervenção nutricional personalizada, e que estudos de genómica nutricional são essenciais para refinar recomendações nutricionais globais. Isto porque em alguns subgrupos populacionais e/ou até mesmo individualmente características genéticas podem definir o comportamento funcional e fisiológico de um nutriente sobre o metabolismo, em que as recomendações nutricionais generalizadas não podem ser aplicadas.


Equipa NutriGenome



Referências:


[1] Abedi E, Sahari MA. Long-chain polyunsaturated fatty acid sources and evaluation of their nutritional and functional properties. Food Sci Nutr. 2(5):443-63, 2014.

[2] Harris WS et al. Omega-6 fatty acids and risk for cardiovascular disease: a science advisory from the American Heart Association Nutrition Subcommittee of the Council on Nutrition, Physical Activity, and Metabolism; Council on Cardiovascular Nursing; and Council on Epidemiology and Prevention. Circulation. 17;119(6):902-7, 2009.

[3] Sergeant S et al. Differences in arachidonic acid levels and fatty acid desaturase (FADS) gene variants in African Americans and European Americans with diabetes or the metabolic syndrome. Br J Nutr. 107(4):547-55, 2012.

[4] Merino DM et al. Polymorphisms in FADS1 and FADS2 alter desaturase activity in young Caucasian and Asian adults. Mol Genet Metab. 103(2):171-8, 2011.


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