Microbiota intestinal e obesidade
- Autora: Vanessa Pereira/ Colaboradora: Cristiane
- Oct 14, 2015
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O programa Human Microbiome Project tem contribuído para um maior entendimento sobre o papel da microbiota no processo fisiopatológico de doenças, nomeadamente da obesidade.
A codificação genética das bactérias que colonizam o trato intestinal humano tem mudado a forma como a função intestinal é compreendida e a importância que lhe atribuímos na redução do risco e tratamento de várias doenças [1,2,3]. A microbiota intestinal pode afectar o balanço energético ao regular genes do hospedeiro responsáveis por modular o gasto e/ou acumulação de energia, influenciando as características metabólicas. Segundo o projecto METAHIT (Metagenómica do Trato Intestinal Humano), cada indivíduo pertence a um dos três grupos de composição bacteriana intestinal, que se designam por enterótipos: Bacteroides (enterotipo 1), Prevotella (enterotipo 2) e Ruminococcus (enterotipo 3). Os grupos de bactérias mais comuns são: Firmicutes e Bacteroides. O Filo bacteriano Bacteroides tem sido associado a um efeito protector contra o desenvolvimento da obesidade, enquanto que os Firmicutes parecem aumentar o risco [1,2]. As dietas ricas em hidratos de carbono e gordura não são obesogénicas por si só, mas conduzem a uma proliferação de Firmicutes que são mais eficientes a extrair energia dos nutrientes, o que resulta num maior aproveitamento das calorias [1,2]. Portanto, não conta apenas o valor calórico das dietas, mas também o perfil intestinal, visto que cada tipo de filo bacteriano apresenta maior ou menor capacidade de metabolização dos alimentos e, consequentemente, maior capacidade de extracção das calorias. No entanto, os estudos são contraditórios em relação à contribuição da proporção dos filos bacterianos para o desenvolvimento da obesidade [1,4]. A alteração do perfil da microbiota intestinal poderá ser a consequência e não a causa da obesidade. Para além da proporção de Firmicutes: Bacteroides, estudos recentes têm identificado alguns mecanismos para tentar explicar a ligação entre a microbiota intestinal e a obesidade [1,4,5,6]. Uma microbiota desequilibrada ou também conhecida como disbacteriose afecta a função metabólica do intestino, o que pode ter várias causas, como excesso de fármacos (ex: antibióticos) [7] e alimentação desequilibrada [8] (ex: consumo elevado de Junk food; refrigerantes; alimentos pré-cozinhados, edulcorantes como o aspartame; bisfenol A, metais pesados, pesticidas). A disbacteriose pode conduzir à permeabilidade intestinal excessiva ou à síndrome do intestino permeável, o que favorece a passagem de substâncias indesejáveis para a corrente sanguínea, afectando também os sistemas hormonal, imunitário, nervoso e podendo conduzir a problemas como enxaquecas, alergias/intolerâncias alimentares, irritabilidade, fadiga crónica, obesidade, entre outros [3,5,6]. Com relação à obesidade, uma microbiota desequilibrada parece estar relacionada à acumulação de gordura por meio da inibição da produção do Fator adipocitário induzido pelo jejum (FIAF) no intestino. O FIAF regula a actividade da enzima lípase de lipoproteína (LPL). A redução do FIAF conduz ao aumento da actividade de LPL, que determina a maior absorção de ácidos gordos, o que resulta numa acumulação de triglicerídeos nos adipócitos5. Um estudo demonstrou que camundongos FIAF-deficientes, ao serem alimentados com uma dieta ocidental, ganharam mais peso corporal que animais FIAD+/+. O FIAF estimula o co-activador do receptor ativado por proliferador de peroxissomo gama (Pgc-1α), o qual está envolvido no aumento da expressão de genes que regulam a oxidação mitocondrial de ácidos gordos [6]. Apesar dos grandes avanços científicos da metagenómica, ainda são necessárias mais investigações para entender a real contribuição do FIAF intestinal para a regulação da adiposidade corporal. Ao ser clarificada a importância do FIAF intestinal, os estudos de genómica nutricional poderão contribuir para estabelecer estratégias nutricionais, como a recomendação de ingestão de substâncias moduladoras do microbioma intestinal (exemplo: prebióticos, probióticos, simbióticos), bem como outras intervenções, entre elas o transplante fecal, as quais podem aumentar a expressão deste factor.
Equipa NutriGenome
Referências:
1. Ley RE, Bäckhed F, Turnbaugh P, Lozupone CA, Knight RD, & Gordon JI. Obesity alters gut microbial ecology. Proceedings of the National Academy of Sciences of the United States of America, 2005. 102(31), 11070-11075 2. Le Chatelier E, Nielsen T, Qin J, Prifti E, Hildebrand F, Falony G et al. Richness of human gut microbiome correlates with metabolic markers. Nature. 2013 Aug 29;500(7464):541-546. 3. Moraes, Ana Carolina Franco de et al. Microbiota intestinal e risco cardiometabólico: mecanismos e modulação dietética. Arq Bras Endocrinol Metab , São Paulo, v. 58, n. 4, jun. 2014 4. .Schwiertz A, Taras D, Schäfer K, Beijer S, Bos NA, Donus C, et al. Microbiota and SCFA in lean and overweight healthy subjects. Obesity. 2010;18(1):190-5. 5. Tsukumo D. M., Carvalho, B. M., Carvalho-Filho, M. A., Saad, M. J.A. Investigação translacional em microbiota intestinal: novos horizontes no tratamento da obesidade. Arq. Bras. Endocrinol Metab. Vol. 53, n.2, 2009. 6. Bäckhed F, Manchester JK, Semenkovich CF, and Gordon JI. Mechanisms underlying the resistance to diet-induced obesity in germ-free mice. Proc Natl Acad Sci U S A 2007; 104: 979-984. 7. .Dethlefsen L, Huse S, Sogin ML, Relman DA. The pervasive effects of an antibiotic on the human gut microbiota, as revealed by deep 16S rRNA sequencing. PLoS Biol 2008;(6):2383– 2400. 8. Turnbaugh PJ, Ridaura VK, Faith JJ, Rey FE, Knight R, Gordon JI. The effect of diet on the human gut microbiome: a metagenomic analysis in humanized gnotobiotic mice. Sci Transl Med 2009a;1:1–10.